Admirável mundo novo do pensamento independente: criando autonomia e independência no processo educacional a partir de A Pedagogia da Autonomia
(Imagens de duas edições da obra. Realizei a leitura e resenha utilizando da edição da segunda imagem).
Informações: Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa/ Paulo Freire — São Paulo: Paz e Terra, 2001 — 18ª edição
(Coleção Leituras) 168 páginas)
Admirável mundo novo do pensamento independente
Resenha
De uma coisa, qualquer texto necessita: que o leitor ou a leitora a ele se entregue de forma crítica, crescentemente curiosa. É isto o que este texto espera de você, que acabou de ler estas “Primeiras Palavras'' (FREIRE, 1996, p. 22).
Publicado em 1996 por Paulo Freire, o conhecidíssimo educador, divulgador e
filósofo, A Pedagogia da Autonomia foi seu último livro escrito ainda em vida.
Nordestino, nascido a 19 de setembro de 1921 em Recife, cursou direito pela
faculdade de Direito de Recife, mas nunca chegou a exercer a profissão, pois se
viu “enfeitiçado” pela docência. Com diversas pesquisas na área educacional,
deixou uma enorme obra que serve como base para a educação internacional, afinal
Freire é um escritor universal e admirado mundialmente por suas teses e
trabalhos produzidos até seus “últimos dias”. Ele faleceu aos setenta e cinco
anos em maio de 1997 (fonte: suapesquisa.com/paulofreire).
Em A Pedagogia da
Autonomia, há uma constante mostra de que somos protagonistas e capazes de mudar
nosso meio, através do uso do conhecimento, — baseado em fatos e o conhecimento,
entendimento segundo o qual não existem verdades absolutas — , da ética e da
responsabilidade que possuímos. Embora boa parte do discurso seja dirigida
diretamente aos professores, pode-se tirar máximas que servem para pessoas de
outras áreas — como por exemplo o respeito às diferenças, o formento à
criticidade e a busca por melhorias e pelo entendimento do mundo. Como seres
diversos, somos o que o mundo cria e o que projetamos no mundo, ou seja, não
estamos apartados do lugar, sociedade em que vivemos; vivemos entrelaçados com a
história, a cultura e o sistema social de qual fazemos parte. Todavia dizer que
a sociedade é a responsável pela criação do que somos, não é dizer que não somos
capazes de modificá-la, melhorá-la. Segundo o autor, nada é determinado,
inexorável ou absoluto. Toma-se por exemplo as muitas revoluções e greves que
tiveram como protagonistas pessoas comuns, que uniram ideais e, enfim, agiram a
favor de um bem comum — a Revolução Francesa é um dos maiores modelos para
outras revoluções; e foi inspiração para outras tanto que ocorreram na nossa
História. Isso revela que temos a escolha ou não de agir e depois de apreender
sobre o nosso redor e afins, fica difícil cruzar os braços e dizer: “é assim,
porque Deus quis assim.”
Trata-se, na verdade [...] de [...] desafiar os grupos populares para que percebam, em termos críticos, a violência e a profunda injustiça que caracterizam sua situação concreta. Mais ainda, que sua situação concreta não é destino certo ou vontade de Deus, algo que não pode ser mudado (FREIRE, 1996, p. 88-89)
Para transformar nosso mundo é preciso aprender a tomar
decisões e principalmente aceitar as suas consequências. E a educação
democrática, crítica e progressista defendida pelo pedagogo, é um dos meios para
enxergar as mazelas do mundo em que vivemos e consequentemente criar autonomia
para pensarmos por nós mesmos e coletivamente. Nos tornando assim, protagonistas
da construção de nosso conhecimento, ao nos lembrarmos e nos depararmos com o
conhecimento histórico humano acumulado. Diferente daquela educação em que há
uma hierarquia entre professor e aluno, em que um aluno não tem “voz” e é visto
meramente como tábula rasa, sem conhecimentos anteriores. Esse tipo de educação
ditatorial, não forma humanos, somente máquinas, seres não pensantes, que apenas
recebem informações e não as usam nas suas relações práticas e reais. Não
aprendem a compreender a sua própria realidade(s).
[…] Ninguém é sujeito da autonomia de ninguém. […] É neste sentido que uma pedagogia da autonomia tem de estar centrada em experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade, vale dizer, em experiências respeitosas da liberdade (FREIRE, 1996, p 120-121).
Por se tratar de um livro com "ares de autoajuda" para quem trabalha com
educação, ou mesmo por apresentar ideias sociológicas e ideológicas claras,
muitos fogem da leitura por causa de preconceitos ou informação de terceiros que
são contra a ideologia de que esse manifesto crítico é a favor: ser atrizes e/ou
atores principais no palco do conhecimento, questionando a velha ordem
estabelecida e naturalizada de que a realidade não pode ser mudada; de que
pobres continuarão pobres, porque foi ideia de “deus” e não organização e
construção social de séculos. Essas pessoas que gritam contra os estudos de
Paulo Freire, concebem de que são pensamentos perigosos. E pela ignorância e
desinformação, continuam reproduzindo o que acham ou o que ouviram de outros,
que também não tiveram e nem procuram ler e estudar as obras do educador.
Posso não aceitar a concepção pedagógica desde ou daquela autora e devo inclusive expor aos alunos as razões por que me oponho a ela mas, o que não posso, na minha crítica, é mentir. É dizer inverdades em torno deles. […] (FREIRE, 1996, p. 18).
Mesmo que as dicas e discussões, apresentadas no texto, sejam para
professores, pré-licenciados, licenciados na área e demais profissionais da
educação, como já comentei anteriormente, A pedagogia da autonomia é para todas
e todos, já que passamos, necessitamos e vivemos educação durante toda nossa
vida. Faça um exercício mental: tente imaginar um mundo sem pensamento, tente
imaginar um mundo sem troca de conhecimentos ou um mundo que já não existem
escolas — claro, imagine também escolas com um modelo educacional baseado na
liberdade, pois no método moderno em geral, não há muitas aberturas para
diálogos — seria possível? Seria utópico demais esperar uma educação crítica? O
educador seria utópico por desejar escolas dessa forma? Conseguiríamos viver sem
educação?
O ser humano carece de liberdade de pensamento e de desenvolver o
respeito a opiniões divergentes. Talvez isso não seja ensinado como modo de
pensar no sistema atual. E por isso, a tese progressista e crítica de Freire
revela que somos capazes de mudar a injustiça desse processo desumanizador.
Basta criar autonomia e vencer os vários defeitos que infectam até as mentes
mais brilhantes. E para começar dependemos de uma mudança no modo de fazer
educação. Impossível? Não.
[…] Não nego a competência, por outro lado, de certos arrogantes, mas lamento neles a ausência de simplicidade que, não diminuindo em nada seu saber, os faria gente melhor. Gente mais gente.” (FREIRE, 1996, p. 165)
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